Passagens
por Sandra Rey
A noção de paisagem não é mensurável pelas coordenadas geográficas acessadas no google maps e, sim, invenção com base no exercício de análise e na encenação dos elementos encontrados na natureza que, se negligenciadas, permaneceriam invisíveis.
Na paisagem, a arte do enquadramento e da composição definem uma construção que atribui medidas à nossa percepção tais como distância, orientação, ponto de vista, escala, pois não se pode pensar a noção de paisagem como uma equação exata entre natureza e realidade percebida. Mas se pode, sim, aproximar a noção de paisagem a uma invenção cuja função é reassegurar, permanentemente, a renovação da percepção do tempo a do espaço que que nos cerca.
Passagens é um conjunto de fotografias e desenhos resultantes da pesquisa que Claudia Hamerski vem desenvolvendo desde 2012. Partem da observação de gramíneas que nascem nas fissuras do concreto a despeito de qualquer agenciamento humano, pequenas vegetações que, a despeito da fragilidade, configuram pequenos focos de resistência à intervenção e desejo humano.
Enquadramento e composição são conceitos-chave no processo de trabalho da série de fotografias e desenhos Passagens, mostrados por Claudia Hamerski nessa exposição.
Nas fotografias, os diferentes pontos de vista desconstroem a ideia de constituir como paisagem um conjunto de coisas quantificáveis, abarcáveis pela ampla vista dos elementos dispostos no entorno. Nas fotografias que a artistas apresenta, o enquadramento elimina qualquer referência sobre o entorno para isolar e dilatar o motivo fotografado. Trata-se de colocar de forma operativa uma relação subjetiva entre o indivíduo e o meio em que vive, relação que se estabelece através do olhar capaz de magnificar o que na natureza surge como ínfimo, insignificante, fora de lugar e frequentemente incômodo. Tão inconveniente quanto resistente: ervas daninhas que nascem em fissuras inóspitas e improváveis.
Já os desenhos da série constroem os quadros de uma nova percepção que busca atribuir unidade de visão às diversas facetas da paisagem. Não resultam da observação direta da natureza mas interpretam as composições das cenas fotografadas, reapresentando, enfaticamente, o mesmo recorte do enquadramento fotográfico.
As composições dos desenhos, com base no redimensionamento de escalas, são elaborados com diligência por pequenos traçados em nuance de tons, desde cinzas quase imperceptíveis, ao negro que capaz de cindir o suporte e conduzir o olhar à total escuridão onde opera uma surpreendente mutação: a transformação de ervas daninhas, em exuberantes Jardins.
Eis as Passagens, a que a artista atribui o título à exposição.
Escrito por Sandra Rey sobre as obras exibidas na exposição Passagens, na Sala Augusto Meyer do IEAVI/Porto Alegre RS, março a abril de 2015.