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Desenho-processo

Ana Zavadil

                                                                                            

             O processo poético de Claudia Hamerski, numa primeira etapa, deu-se através do desenho com o uso da fotografia para ajudar na sua concepção. Nessa série de trabalhos vamos conhecer o resultado de sua pesquisa desenvolvida durante o último ano, onde o desenho ainda é a linguagem principal, porém estabelece conexões com outros meios, tanto técnicos quanto formais.

              Os desenhos possuem a característica de irradiarem-se em sutis relações de linhas e transparências configurando um processo repetitivo e rizomático, já que são construídos a partir do tronco de árvores e de maneira serial e modular. O desenho se espalha sobre a superfície e mesmo não chegando até as bordas da tela ou da madeira, torna este limite invisível e causa a sensação de expandir-se infinitamente.

               O estêncil é usado em alguns trabalhos na intenção de multiplicar combinações de um mesmo elemento, criando modulações para o olhar, possibilitando mudanças no decorrer dessas misturas de materiais e apontando a fotografia não só como parte do processo, mas como resultado final.

               Um novo estimulo para a criação surge através de um objeto tridimensional, feito de tela e arame, onde a percepção visual dá-se através do espaço. Esse objeto apresenta-se como um corpo pendurado e atravessado pela luz que delineia as suas tramas e a sua identidade através de sombras. Estas sombras são direcionadas para uma tela colocada na parede e transformadas em desenhos.

               A paisagem visual criada pelos trabalhos é o resultado de experiências e evidencia a maneira cambiante do desenho em diversificados suportes trazendo diferenças significativas em seu conjunto. O processo desdobra-se e quanto maior o tempo de elaboração, maiores serão as nuances nos resultados.

               Para essa exposição é reservado um lugar na parede onde a artista vai dar início a um trabalho interativo: desenhar e convidar dois artistas para participarem desse projeto. A efemeridade e a metamorfose fazem parte do seu processo, pois a obra em se fazendo é a mola propulsora para novas experimentações e descobertas e, no atual momento, o processo e o produto final estão em ordem de equivalência para a artista.

               O que Claudia Hamerski busca é extrapolar os limites do desenho, desafiar percepções e provocar o expectador a descobrir o desenho entre as tramas de linhas enquanto elas existem, pois nesta expansão do processo tudo pode vir a acontecer. Hoje o desenho é o resultado final, amanhã ele poderá ser apenas parte do processo, um meio para chegar a outro lugar.

Ana Zavadil

 

 

Ana Zavadil, curadora, pesquisadora e crítica de arte.

 

*Texto escrito para a exposição Em processo realizada em 2009 na Galeria Arte & Fato, Porto Alegre RS.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tramas do olhar

Ana Zavadil

 

                                                                                           

            A rede de linhas que transforma o espaço, estendendo-se além dos limites do visível sugere dois momentos: o do olhar aproximado e o do olhar distanciado. No primeiro caso, vamos nos ater no detalhe, onde o movimento das linhas é rico em minúcias; no segundo, podemos visualizar  o conjunto que se expande em uma estrutura harmônica e modular cujas linhas permitem que  o olhar  se desloque em qualquer direção.

            O elemento árvore rege a composição; o seu tronco ricamente  elaborado em linhas proporciona o seu agigantamento, pois ele é fotografado de baixo para cima para depois ser desenhado da mesma maneira. A sua força contrasta com a delicadeza dos galhos que traçam um emaranhado de linhas no céu e, mais tarde no papel.

            O reconhecimento do objeto representado se perde na contemplação do conjunto, pois Claudia Hamerski altera a lógica quando brinca com a nossa percepção; o senso lúdico, no sentido de jogo formal, nos desorienta e passamos a enxergar outras figuras através do espelhamento das imagens. A tradução silenciosa do imaginário nos conduz por caminhos que buscam semelhanças e/ou significados na sua obra latente de transformações. Será que o que vemos são árvores, neurônios, veias, linhas ou manchas que se movimentam sobre o papel?

            A trama em linhas nos instiga a buscarmos as conexões entre as partes e o todo, onde os desenhos sutis elaboram paisagens e, com os espaços vazios, promovem as pausas necessárias para que o equilíbrio seja o mediador do nosso olhar. Assim, o trabalho é construído por meio de uma articulação modular autônoma, onde cada módulo fala por si ou dialoga com o outro, expandindo-se do papel à parede, numa sintonia rítmica, gradeada e de desdobramento infinito.

            O caminho da obra é determinado pelo fazer, na medida em que os fragmentos formam uma grande composição  e estabelecem uma ação visual calcada na técnica e na busca de novos rumos dentro do seu processo criativo. Apenas papel e grafite e a multiplicidade de relações possíveis entre os desenhos tornam a sua criação sempre renovada e sempre aberta às transformações decorrentes das repetições.

            A repetição, como procedimento plástico, constrói possibilidades e variantes no conjunto final: os módulos da artista tornam-se ricos em suas diferenças, reafirmando que “... o procedimento mesmo sendo sistemático e recorrente, se diferencia da criação de um padrão.” ( CATTANI, 1998, p.199).

            O desenho como linguagem, na arte contemporânea, tece relações da matéria dentro de um limite de tempo e espaço e torna-se o instrumento através do qual o autor expressa o seu pensamento. É assim, que através das tramas de linhas que tramam o nosso olhar que Claudia Hamerski nos apresenta os seus desenhos.

 

                                                                                                                                                                                                                                                                        

 

REFERÊNCIAS:

 

CATTANI, Icleia. Série e repetição na arte moderna e contemporânea. In OLIVEIRA, Ana Claudia May. FECHINE, Ivana (eds). Semiótica da Arte: teorizações, análises e ensino. São Paulo: Hacker Editores (Centro de pesquisas sócio semióticas/PUC/SP/CNRS0. 1998, p.193-200.

 

 

Ana Zavadil, curadora, pesquisadora e crítica de arte.

 

*Texto escrito para a exposição Transitáveis realizada em 2008 na Galeria de Marte, Porto Alegre RS.

 

 

 

 

 

 

 

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